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Potenciais efeitos terapêuticos da cannabis medicinal em pets

O uso terapêutico e medicinal da cannabis vem ganhando destaque desde que os seus compostos principais foram isolados, quantificados e testados em estudos in vitro e pré-clínicos.

Atualmente, são conhecidas mais de 100 diferentes moléculas ativas presentes na cannabis, os chamados fitocanabinóides e, dentre eles, os mais abundantes e consequentemente mais estudados são o THC (Tetrahidrocanabinol) e o CBD (Canabidiol).

Enquanto o THC é responsável pelos efeitos psicoativos da cannabis, o CBD é responsável pelos efeitos medicinais e terapêuticos da planta. Apesar do interesse crescente, atualmente o uso do CBD na medicina veterinária é incipiente. Neste conteúdo, abordaremos os dados disponíveis sobre o uso de CBD em animais de estimação, especialmente em cães e gatos.

Sistema Endocanabinóide

O sistema endocanabinóide está presente em quase todas as espécies animais, formado por três componentes:

Ligantes endógenos: São os chamados endocanabinóides, dos quais os mais conhecidos são a anandamida e o 2AG (2-Araquidonoil-Glicerol).

Receptores endocanabinóides: Receptores do tipo metabotrópico (acoplados à proteína G), sendo os subtipos CB1 e CB2 os mais estudados.

Enzimas: Responsáveis pela metabolização dos endocanabinóides, sendo a amida hidrolase de ácidos graxos (FAAH) a enzima que degrada a anandamida, enquanto a lipase de monoacilglicerol (MAGL) degrada o 2AG.

Os receptores CB1 são primariamente expressos no sistema nervoso central e nervos periféricos e, em menor quantidade, em tecidos dos sistemas cardiovascular, gastrointestinal e reprodutivo. Já os receptores CB2 estão expressos em células do sistema imune, no baço e amígdalas.

Uma característica interessante é que, ao passo que os receptores CB1 apresentam estrutura semelhante através das espécies de mamíferos, os receptores CB2 diferem na quantidade de aminoácidos e, consequentemente em sua estrutura, entre humanos, ratos, camundongos e cachorro [1].

Como consequência, a afinidade destes receptores também será divergente, implicando em maior cautela na hora de extrapolar doses estudadas em humanos ou roedores para os cães, por questões de segurança e eficácia [1].

CBD em cães e gatos: farmacocinética e segurança terapêutica

Os efeitos do CBD em cães foram reportados por ser proporcional à dose, sendo a dose mais alta mais eficaz. Em uma dosagem de 2 mg/kg administrada oralmente duas vezes ao dia, o CBD apresenta uma meia vida (t1/2) relativamente curta, indo de 01 a 4,2h e atingindo concentração sérica máxima (Cmax) de 102 a 301 ng/mL em um período de 1,4 a 1,5h (tmax) [2,3].

Administrado sozinho, o CBD não é capaz de provocar efeitos colaterais significativos [4]. No entanto, quando administrado em combinação com THC, foram observados efeitos adversos severos, de maneira dose-dependente, o que sugere que, quando combinados, o CBD tem poder de potencializar os efeitos psicoativos e fisiológicos do THC. Isso pode acontecer devido à capacidade do CBD em alterar as propriedades farmacocinéticas (absorção e distribuição) e farmacodinâmicas do THC [4,5].

Os estudos farmacocinéticos e farmacodinâmicos em gatos, apesar de mais escassos, demonstraram que o CBD administrado no intervalo de doses de 2,8 mg/kg a 30,5 mg/kg, o tmax foi de 3,3h e a Cmax de 250 μg/mL na dose de 25 mg/kg [2,6].

Por outro lado, uma única dose de 2 mg/kg administrada duas vezes ao dia apresenta tmax de 2h e Cmax de 43 ng/mL. A presença de efeitos colaterais foi mínima, com alguns animais apresentando hipersalivação, êmese e comportamentos de lambidas excessivas durante a administração. Não foram reportadas alterações hepáticas, demonstrando que a administração de CBD em gatos aparenta ser segura [2,6].

Ação da cannabis medicinal no gerenciamento da dor

Os tipos mais comuns de dores apresentadas por animais de estimação são dor neuropática e dores advindas de câncer e os medicamentos mais comumente utilizados pertencem à classe dos opioides, que carregam consigo uma gama de efeitos colaterais e adversos como injúrias renais, cardiovasculares e gastrointestinais e até mesmo alterações comportamentais [1].

Nesse sentido, o CBD tem ganhado força como um bom agente no gerenciamento da dor por não causar dependência, não ser psicoativo e ser bem tolerado.

Até o momento, existem estudos demonstrando o uso de CBD para dores crônicas em cães, administrados sozinho ou combinados com outros medicamentos como a gabapentina. De maneira geral, a administração de CBD foi capaz de aliviar as dores dos cães, melhorando sua qualidade de vida. Outros estudos são necessários e estão sendo conduzidos sobre a segurança do uso de CBD a longo prazo, especialmente em animais debilitados [1].

Efeitos antiinflamatórios da cannabis medicinal

De maneira semelhante a dor, o tratamento com anti-inflamatórios também é um desafio na prática veterinária, uma vez que medicamentos anti-inflamatórios apresentam efeitos colaterais significativos, especialmente quando em uso prolongado ou crônico [1].

A ação anti-inflamatória do CBD se deve à sua capacidade de suprimir citocinas pró-inflamatórias e quimiocinas tais como TNF-α, IFN-γ, IL-10, and IL-6, dentre outras, além de modular a ativação e proliferação de linfócitos [1].

Apesar de serem observados bons resultados após a administração de CBD em ratos e camundongos, não há até o momento estudos demonstrando os potenciais efeitos anti-inflamatórios do composto em cães e gatos [1].

Efeitos ansiolíticos e calmante

Animais de estimação podem experienciar ansiedade e/ou irritação por terem histórico de ambientes agressivos ou hostis, como abrigos impróprios, canis clandestinos, situação de rua, tutores negligentes ou até situações em que são expostos a alguma novidade. Cães frequentemente apresentam a chamada ansiedade de separação, onde há o sofrimento do animal pelo afastamento ou ausência física do tutor [1].

A ativação do sistema de defesa é uma consequência da ativação de respostas estressoras do animal, que pode ser percebida por sinais fisiológicos como taquicardia, tremores, aumento de salivação, distúrbios gastrointestinais e alterações de comportamento como imobilidade, andar em círculos, inquietação e, em casos mais extremos, agressividade [1].

Através da interação do CBD com receptores dos sistemas serotoninérgico e endocanabinoide presentes em estruturas relacionadas à ansiedade, como núcleos da rafe, hipocampo, córtex, amígdala e hipotálamo, ratos e camundongos apresentaram efeito ansiolítico em testes comportamentais [1].

Em cães de abrigo foi demonstrado que a administração de CBD reduziu a agressividade quando interagiam com humanos. Para cães e gatos de estimação, não há resultados demonstrando o potencial efeito ansiolítico da administração de CBD [7].

O CBD é um composto com bastante potencial terapêutico e que desperta crescente interesse na prática clínica na área veterinária. Para o gerenciamento da dor, principalmente neuropática e de dores advindas do câncer, o CBD pode ser uma melhor escolha quando considerados os efeitos colaterais e adversos induzidos pelos fármacos comumente utilizados nestas situações.

Para tratamento de quadros inflamatórios e alterações comportamentais, mais estudos são necessários para garantir sua eficácia, tolerância e segurança em cães e gatos.

 

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Referências

[1] Yu CHJ, Rupasinghe HPV. Cannabidiol-based natural health products for companion animals: Recent advances in the management of anxiety, pain, and inflammation. Res Vet Sci. 2021 Nov;140:38-46. doi: 10.1016/j.rvsc.2021.08.001.

[2] Deabold KA, Schwark WS, Wolf L, Wakshlag JJ. Single-Dose Pharmacokinetics and Preliminary Safety Assessment with Use of CBD-Rich Hemp Nutraceutical in Healthy Dogs and Cats. Animals (Basel). 2019 Oct 19;9(10):832. doi: 10.3390/ani9100832.

[3] Gamble LJ, Boesch JM, Frye CW, Schwark WS, Mann S, Wolfe L, Brown H, Berthelsen ES, Wakshlag JJ. Pharmacokinetics, Safety, and Clinical Efficacy of Cannabidiol Treatment in Osteoarthritic Dogs. Front Vet Sci. 2018 Jul 23;5:165. doi: 10.3389/fvets.2018.00165.

[4] Vaughn D, Kulpa J, Paulionis L. Preliminary Investigation of the Safety of Escalating Cannabinoid Doses in Healthy Dogs. Front Vet Sci. 2020 Feb 11;7:51. doi: 10.3389/fvets.2020.00051.

[5] Chicoine A, Illing K, Vuong S, Pinto KR, Alcorn J, Cosford K. Pharmacokinetic and Safety Evaluation of Various Oral Doses of a Novel 1:20 THC:CBD Cannabis Herbal Extract in Dogs. Front Vet Sci. 2020 Sep 29;7:583404. doi: 10.3389/fvets.2020.583404.

[6] Kulpa JE, Paulionis LJ, Eglit GM, Vaughn DM. Safety and tolerability of escalating cannabinoid doses in healthy cats. J Feline Med Surg. 2021 Dec;23(12):1162-1175. doi: 10.1177/1098612X211004215.

[7] Corsetti S, Borruso S, Malandrucco L, Spallucci V, Maragliano L, Perino R, D’Agostino P, Natoli E. Cannabis sativa L. may reduce aggressive behaviour towards humans in shelter dogs. Sci Rep. 2021 Feb 2;11(1):2773. doi: 10.1038/s41598-021-82439-2.