A depressão é o transtorno mental mais comumente diagnosticado, e estima-se que seja a principal causa global de incapacidade [1]. Além disso, a prevalência da depressão ao longo da vida chega a 14%, e o risco de desenvolver o transtorno é influenciado por fatores genéticos e ambientais [2].
O número crescente de casos de depressão e a carga que essa condição exerce sobre a economia, destacam a necessidade urgente de pesquisa e identificação de novos compostos terapêuticos que possam ser incorporados às opções atuais de tratamento deste transtorno.
Tratamentos padrões da depressão
Atualmente, o padrão de tratamento da depressão consiste em uma combinação de psicoterapia e tratamento farmacológico, visando reduzir os sintomas depressivos.
Entre as classes de drogas antidepressivas mais comumente prescritas estão os inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRSs), os inibidores seletivos da recaptação da serotonina-noradrenalina (IRSNs) e os antidepressivos tricíclicos (ADTs) [3].
Outros compostos também são prescritos, como inibidores da monoamina oxidase (MAO), antagonistas do receptor adrenérgico α-2, inibidores seletivos da recaptação da noradrenalina, agonistas do receptor da melatonina, antagonistas do receptor 5-HT2C da serotonina e inibidores seletivos da recaptação da noradrenalina/dopamina [3].
Demanda para novos compostos terapêuticos no tratamento farmacológico da depressão
Apesar de o tratamento farmacológico para depressão ser amplamente aplicado e disponível, uma meta-análise de 165 ensaios controlados por placebo indicou que apenas 54% dos adultos apresentam melhora, definida como redução de 50% dos sintomas, após semanas de tratamento com medicação antidepressiva [3,4].
Além disso, cerca de 30% dos pacientes com transtorno depressivo maior (TDM) sofrem de depressão resistente ao tratamento, definida como depressão que não atinge a remissão completa apesar do tratamento com pelo menos dois agentes diferentes em doses adequadas e por durações adequadas [5].
Esses dados evidenciam a demanda urgente para a inclusão de novos compostos terapêuticos no tratamento farmacológico da depressão.
Efeito positivo do canabidiol no alívio dos sintomas de depressão
Um dos novos compostos potenciais recentemente sugeridos em estudos pré-clínicos como tendo um efeito positivo no alívio dos sintomas de depressão é o canabidiol (CBD) [6, 7].
Pesquisas recentes relataram que o CBD modula os padrões de metilação do DNA em regiões do cérebro relevantes para a neurobiologia da depressão, sugerindo que esse mecanismo epigenético poderia ser responsável pelos efeitos antidepressivos induzidos pelo CBD [7].
Mecanismos epigenéticos envolvidos na vulnerabilidade para a depressão
Um fato que está bem estabelecido é que os fatores genéticos com fatores ambientais que ocorrem ao longo da vida provavelmente estão por trás da vulnerabilidade para a depressão.
O estresse é o principal fator ambiental que aumenta a vulnerabilidade à depressão, causando desregulação de vários sistemas de neurotransmissores (monoaminas, endocanabinoides, glutamato, GABA), aumento da neuroinflamação, distúrbios endócrinos e neuroplasticidade prejudicada, resultando em adaptação prejudicada a eventos aversivos subsequentes e humor deprimido [8].
Todos esses mecanismos podem ser regulados por alterações epigenéticas, como modificações de histonas (por exemplo, por HDACs) e metilação de DNA (por DNMTs), que exercem o controle transcricional para a síntese e degradação de enzimas, transportadores, receptores, neurotrofinas, proteínas sinápticas e mediadores de inflamação.
Nesta direção, um papel importante dos mecanismos epigenéticos tem sido sugerido, tal como a metilação do DNA, regulada pelas enzimas DNA metiltransferases (DNMTs), na neurobiologia da depressão e no efeito de drogas antidepressivas.
De fato, o estresse altera a metilação do DNA, enquanto o tratamento com inibidores de DNMTs (5-AzaD ou RG108), assim como com antidepressivos convencionais, atenuam essas modificações em estruturas límbicas associadas a depressão, em modelos pré-clínicos [7].
Estudos epigenômicos em seres humanos utilizando a cannabis e os seus compostos derivados
A cannabis e os seus compostos derivados (CBD e THC) alteram os níveis de metilação de genes específicos [9], e a identificação destes genes pode ser um primeiro passo para entender como a cannabis e os seus compostos derivados podem, ao nível molecular, contribuir para mudanças na sintomatologia da depressão.
Numa revisão da literatura publicada na revista Genes, os autores identificaram 95 genes, residindo em loci associados ao TD, e que também foram relatados como diferencialmente metilados após exposição à cannabis ou aos seus compostos derivados [10].
A metilação do CDH13 desempenha um papel protetor em modelos de estresse
O gene CDH13 foi identificado de forma mais consistente entre os 95 genes como diferencialmente metilado após exposição a compostos derivados de cannabis.
O CDH13 atua como um regulador negativo da proliferação neural, é amplamente expresso em todo o cérebro humano, e sua expressão é crucial para o crescimento de neuritos e a localização de neurônios motores, bem como a formação de sinapses em neurônios com especificações monoaminergicas ou GABAérgicas [11, 8].
O gene CDH13 foi regulado positivamente na amígdala de pacientes com depressão e, paralelamente, demonstrou desempenhar um papel protetor em vários modelos expostos a estressores ambientais [12, 11].
Com base nessas evidências, é concebível que a regulação epigenética de CHD13 por compostos derivados de cannabis possa modificar os sintomas de depressão pela alteração de seus níveis de expressão, que já são conhecidos por serem perturbados no cérebro de pacientes com depressão [12].
Outros genes entre os 95 que foram consistentemente identificados nos estudos incluíam dois genes dos canais de cálcio controlados por voltagem, CACNA1C e CACNA1E [10].
Esses genes estão altamente associados a vários fenótipos de transtornos mentais, como transtornos do neurodesenvolvimento, deficiência intelectual, transtorno bipolar, ansiedade e depressão, e há evidências crescentes de que a expressão de CACNA1C no cérebro regula diretamente os comportamentos relacionados à depressão [13].
Efeitos epigenéticos da cannabis e seus compostos derivados em loci de riscos robustos para transtorno depressivo maior
Nesta mesma revisão, publicada na revista Genes, e com base em estudos em humanos, os autores também encontraram 12 genes únicos que residem em loci associados ao TDM, e que se sobrepuseram a genes diferencialmente metilados após exposição à cannabis, com 9 deles (ESRRG, CACNA1C, GPC5, FAM189A1, MAD1L1, ADARB2, RERE, PCDH9 e RBFOX1), que também foram identificados como sobrepostos aos genes TDM em estudos em animais de exposição ao CBD ou THC [14, 15], indicando que existem efeitos epigenéticos da cannabis e seus compostos derivados.
Em suma, múltiplos genes residentes em loci associados à depressão foram regulados epigeneticamente pela exposição à cannabis ou seus compostos derivados. Essa regulação epigenômica ocorreu em genes cruciais para o desenvolvimento neuronal, funcionamento, sobrevivência e funcionamento de sinapses.
Diante de tais resultados, mais estudos em modelos animais, combinados com ensaios clínicos, deverão ser realizados para mapear quais as mudanças moleculares exatas estão subjacentes a essas mudanças fenotípicas desencadeadas pelos mecanismos epigenéticos pela cannabis e seus compostos derivados.
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Referência:
[1] World Health Organization (WHO). The Global Burden of Disease; 2004 Update; World Health Organization: Geneva, Switzerland, 2008.
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